Experts em times de alta performance compartilham sua experiência sobre o assunto. Entenda como implementar uma visão ágil no contexto do seu time de produto.
Se você não sabe muito bem o que é metodologia ágil, já falamos dela aqui. Esses métodos podem ser centrais para lideranças que desejam quebrar antigos padrões na organização.
No quarto dia da Digital Product Week 2018, reunimos dois especialistas para falar desse tema: Luis Novo, CEO da Skore, plataforma de educação digital; e Danilo Fascio, Partner da Target Teal, empresa de Design Organizacional.
Confira neste artigo todas as considerações que eles trouxeram sobre o assunto. Deixamos um e-book bônus ao fim do texto que certamente vai complementar sua visão.
Luis começou refletindo sobre a natureza de cada organização.
“Toda empresa tem um grupo de habilidades que busca. No nosso caso, gostamos de gente curiosa, é isso que nos deixa empolgados com as pessoas”.
De acordo com ele, isso é fundamental para a Skore, porque as coisas mudam tanto por lá que não dá para saber o que o colaborador vai fazer dali a três meses.
“A pegada pra gente é conseguir alguém que vá se adaptar pra mudança — hoje, todo mundo na Skore já mudou de papel”.
Danilo lembrou:
“A inteligência nada mais é do que pura curiosidade”,
Para ele, a base desse modelo está na separação entre pessoa e cargo. A prioridade devem ser os papéis de uma empresa.
“Precisamos identificar quais são os papéis ligados à organização. Depois que os mapeamos, conectamos esses papéis às pessoas. É uma abordagem mais múltipla,” contou ele.
Na Skore, é assim que funciona.
“Nós damos liberdade para as pessoas transitarem entre os papéis da empresa. Pessoas do financeiro vão cuidar de gente, depois de marketing e por aí vai. Nesse ‘trânsito’, você pode descobrir um novo talento delas”.
Mas a pessoa transita ou acumula papéis? De acordo com o CEO, elas podem acumular papéis — tomando-se o cuidado para não sobrecarregá-las. O importante é que ela tenha liberdade para fazer isso dentro da organização, não sendo julgada por “dar muito alt+tab” no dia a dia.
Um dos maiores desafios da metodologia ágil é quebrar padrões engessados. O que fazer para promover essa mudança quando a empresa é refratária a ela? Para Danilo, o segredo é apostar nos pequenos grupos que estão dispostos a mudar.
“Como somos uma empresa de consultoria, se somos chamados para redesenhar uma organização, sempre existe um conjunto de pessoas dispostas a fazer um experimento”
Depois, a tendência é que o grupo se torne um exemplo dentro da organização, influenciando positivamente.
Outro ponto fundamental é ter alguém “lá em cima que ‘patrocine’ a transformação”: o CEO ou outro executivo realmente a fim de transformar a operação, dando suporte e orientação para enfrentar os problemas que certamente virão.
Danilo alerta:
“A camada de gestores é a mais difícil de ser trabalhada, porque está mais distante da entrega de valor”.
Por isso, você tem que identificar quem são aqueles nos níveis mais altos que perceberam que o trabalho precisa ser repaginado e que é preciso reduzir a hierarquia de poder.
“Toda transformação depende de uma pessoa com poder institucional forte para proteger isso. Ela precisa entrar na briga”.
Uma das práticas ágeis mais recorrentes é o trabalho remoto. A Skore passou por essa experiência, e Luis compartilhou vários aprendizados sobre ela.
“Ideologicamente, nós nos alinhamos muito com o conceito de trabalho remoto. Para nós, o que mais funcionou foi ter acesso a talentos que talvez não encontrássemos em SP — desenvolvedores principalmente”
A Skore chegou a ter 75% do time remoto. Em todas as áreas — de Product Managers até Desenvolvedores -, havia colaboradores fora do escritório, de São Paulo e até do país. Para manter todo mundo engajado e alinhado, a saída foi muita comunicação.
“Você tem que compensar o cafezinho com calls e mais calls, vídeo-conferências, Skype e Slack”.
Mas chegou um momento em que o business estava “tão acelerado” que não foi possível sustentar esse modelo remoto. A solução foi buscar um modelo híbrido.
“Mantivemos um time remoto que estava com a gente, mas investimos em mais pessoas no escritório. Tivemos que aceitar perder o acesso a talentos que o modelo proporcionava”.
Tudo isso é muito lindo, muito moderno. Mas como uma organização leve e ágil, com times remotos, elabora e preserva a cultura? No caso da Skore: de modo inovador, também.
“Estabelecemos que a cultura pode ser desenhada e pensada por todos. O time estava super remoto, mas todo mundo veio para São Paulo e rolaram várias conversas que ajudaram a editar pedaços da nossa cultura, de um jeito colaborativo”.
Luis lembrou que, quando a empresa cresce muito e você tem 100, 200 funcionários, esse trabalho colaborativo com a cultura já não será possível. São necessários gestores que são “guardiões da cultura”.
Mas, no momento, está funcionando muito bem, com um detalhe importante:
“Como CEO, isso me força a ser muito honesto. Qualquer deslize vai aparecer escancarado na minha cara. Tenho que estar muito aberto a ouvir meu time pleitear coisas que às vezes eu não queria que ele pleiteasse. Mas é uma relação muito mais justa.”
Danilo complementou:
“A cultura pode dirigir você, ou você pode dirigir a cultura”.
De acordo com ele, o trabalho da Target Teal não é de mudar a cultura de uma empresa, mas de ensinar a organização a pilotar essa cultura — e dar atenção a ela.
Outro modelo ágil que a Skore experimentou na área de Gestão foi a Holacracia — uma estrutura organizacional circular, em que cada pessoa responde pelo papel que exerce, tornando-se dona dele.
“Uma vez que ela se candidatou e foi escolhida para exercer aquele ou aqueles papéis, ninguém mais vai dizer o que a pessoa tem que fazer.”
Só que aí veio um choque: algumas pessoas simplesmente não estão preparadas pra toda essa autonomia.
“Elas ouviam: ‘pronto, tá aqui o seu papel, cuide dele’, e respondiam: ‘Como assim? Ninguém vai me dizer o que fazer?’”
Neste momento, Danilo lembrou-se de uma famosa frase atribuída a Steve Jobs: “Não faz nenhum sentido contratar pessoas brilhantes e dizer a elas o que fazer.”
Depois dessa experiência, Luis optou por um modelo novamente híbrido.
"Mantivemos os papéis, mas escolhemos algumas lideranças para tomar decisões mais importantes."
Para Danilo, aqui está outra essência do modelo ágil: a substituição de hierarquia de poder pela hierarquia de propósito, de escopo.
“Esse modelo de círculos que o Luiz mencionou tem papéis responsáveis por determinar qual a estratégia a ser adotada. O poder ainda existe. O que muda é que esse poder não envolve mais influenciar o trabalho das pessoas, dizer como elas devem fazer as tarefas”.
Esse é um problema pelo qual quase todas as empresas passam. No caso das estruturas ágeis, Danilo traz uma provocação:
“Será que a equipe está desengajada por ela mesmo ou será que é a organização que não apresenta motivos para engajamento? A resposta é: olhe para si mesmo. É muito mais fácil culpar as pessoas, mas é importante olhar para a organização”
De acordo com o Partner da Target Teal, é normal encontrar empresas que querem mudar, mas que têm barreiras implícitas para isso. Ele lembra que, na transformação para o modelo ágil, a coerência é essencial.
Outra pedra no caminho dessa mudança são colaboradores que vivem comparando-a com lugares em que já trabalharam. O famoso “ah, já vivi isso na outra empresa, não deu certo”. O conselho de Danilo Fascio é demonstrar empatia ao lidar com eles, mostrar abertura para conversa e mostrar que a empresa em que estão é outro lugar:
“Você tem que tentar aumentar a segurança psicológica da pessoa”.
Agora, se ela não quiser mesmo, se estiver refratária, não tem jeito, é melhor procurar outro caminho. Luis concorda:
“A pessoa precisa entender que aqui não é igual ao lugar anterior. Ou ela aceita isso, ou tem que sair”.
Para finalizar o papo, os dois somaram recomendações preciosas de leituras complementares:
Reinventando as organizações, de Frederic Laloux
Liderando com Metas Flexíveis, Niels Plaeging
Beyond budgeting, de Jeremy Hope e Robin Fraser;
Agile IT organization design, de Sriram Narayan;
Measuring and managing performance in organizations, de Robert D. Austin;
Turn the ship around, L. David Marquet.
Para quem já está lidando com o desafio de trabalhar com métodos ágeis ou liderar equipes de alta performance, vale se aprofundar lendo o e-book "Métodos Ágeis: um guia prático com tudo que você precisa saber sobre metodologias ágeis". Faça o download gratuito!