Os vieses cognitivos podem influenciar tomadas de decisões e percepções em pesquisas de UX. Entenda mais com a expert Denise Rocha, UX Lead no banco BV.
Uma das bases mais importantes do trabalho em UX são as pesquisas, já que elas tornam as percepções do time mais claras sobre as necessidades e opiniões do público usuário. No entanto, entre o que essas pessoas transmitem e o que UX researches entendem pode haver distorções não propositais. Por isso, entender vieses cognitivos é essencial.
Naturalmente, a mente humana tenta associar percepções provenientes das pequisas às experiências, traumas, ideias, memórias e até mesmo equívocos que pesquisadores cometem. Por isso, quanto maior for a capacidade de perceber os vieses cognitivos, mais qualificado será esse trabalho de UX research.
Vamos abordar esse tema com mais detalhes com a ajuda de Denise Rocha, UX Lead e Business Design Coordinator no banco BV e expert na Tera. Acompanhe!
Vieses cognitivos são padrões de pensamento que nossa mente aplica diretamente sobre percepções e opiniões na tentativa de criar padrões de análise.
Em UX, quando nos deparamos com alguma opinião, a reação natural é tentar encaixar essa informação dentro de uma categoria definida automaticamente por nós. O grande problema é que isso pode ser perigoso. Afinal, a ideia é captar a opinião, analisá-la de maneira fria e, a partir disso, considerar o que foi absorvido para aplicar em produtos.
Os vieses cognitivos precisam ser identificados. Se isso é feito, o problema é encerrado ali mesmo. Porém, o desafio pode ser grande, uma vez que há mais de 180 vieses identificados e muitos deles são realmente armadilhas que podem pegar até mesmo as pessoas mais experientes em UX research.
Na hora de identificar esses vieses, precisamos entender que a nossa mente tem papel fundamental na criação desses padrões. É isso que defende a expert Denise Rocha. Segundo ela, isso acontece porque queremos encaixar essas percepções em alguns direcionamentos que tornam mais fácil a nossa forma de refletir sobre determinadas ideias.
“Vieses são uma tendência da nossa cabeça em seguir determinado caminho, determinada direção. É uma forma do nosso cérebro agrupar informações.” – Denise Rocha
Os vieses estão presentes na nossa sociedade como um todo. É por esse motivo que, enquanto pessoas, temos uma grande tendência a enviesar qualquer coisa que ouvimos, não por mal, mas pela maneira como nosso cérebro processa informações a fim de facilitar a compreensão e o armazenamento dessas percepções.
É algo que ocorre no nosso subconsciente, mas que deve ser encarado como algo a ser evitado. Se já é importante tentar evitar vieses cognitivos em nossas relações sociais comuns no dia a dia, é ainda mais fundamental combater isso quando se está na posição de profissional de UX.
Profissionalmente, tentamos ter eficácia em tudo que fazemos. Principalmente em dias de ritmo acelerado. Mas não dá para ser assim em UX research, ou algum viés cognitivo vai surgir de maneira tão natural que será difícil perceber.
Segundo a expert de UX Denise Rocha, nosso cérebro busca agrupar informações para que seja mais fácil associá-las a ideias que temos em nossa cabeça. Ou seja, é mais "confortável" captar essas opiniões e já analisá-las de maneira enviesada.
“Vieses são uma tendência da nossa cabeça em seguir determinado caminho, determinada direção. É uma forma do nosso cérebro agrupar informações.”
Vieses nem sempre são ruins. Tudo que falamos até aqui com um tom de alerta se trata de reforçar como pode ser perigoso captar uma opinião em pesquisa de UX e compreender essa informação de maneira diferente. Ou seja, enviesada.
Alguns vieses são bons porque nos permitem agir de maneira precisa e rápida. Sabendo da existência desses, muitas empresas os utilizam para organizar informações, além criar interfaces com maior capacidade de gerar engajamento e conversões.
Esses vieses tradicionais que permeiam a sociedade são comumente utilizados pelo Marketing e storytelling para gerar resultados. Em uma lista dos principais, profissionais de UX não podem deixar de conhecer:
prova social – Este é um viés que preza pela opinião de outras pessoas para influenciar a de terceiras. Ou seja, se uma pessoa usuária vê uma boa avaliação e recomendação de outros, a tendência é ter maior aceitação.;
efeito bandwagon (efeito adesão) – É similar à prova social, mas está mais relacionado à aprovação de clientes em mercados B2B;
efeito Forer/Barnum – É um viés que se baseia na aprovação das pessoas em relação a descrições supostamente personalizadas para si, mas que na verdade são ideias gerais que se encaixam em uma ampla variedade de usuários/clientes;
escassez – Está relacionado ao maior interesse de pessoas por produtos, coisas ou oportunidades em que há a clara informação de escassez;
autoridade – É o viés que liga a aprovação sobre algo à recomendação de uma pessoa que seja autoridade em determinado assunto, mercado ou produto.
Os vieses em UX Research têm maior peso e podem afetar as informações que são levadas ao time do produto. Entender como funcionam, o que funciona como gatilho a eles e como evitar é essencial. A expert Denise Rocha aponta três desses principais vieses cognitivos: viés de confirmação, viés de expectativa e viés de desejabilidade social. Conheça cada um.
O viés de confirmação trata de uma possível inclinação à filtragem de informações, dando prioridade somente ao que, de alguma forma, está alinhado com suas próprias crenças. Ou seja, em UX research, pessoas pesquisadoras podem dar mais ênfase às ideias e afirmações nas quais acreditam e nas opiniões que compartilham, preterindo outras informações igualmente importantes. Ou seja, se trata de valorizar somente aquilo que é uma crença em comum.
Segundo Denise Rocha, o grande risco quando acontece o viés de confirmação é simplesmente deixar escapar todo o resto que uma pessoa diz durante uma entrevista. Para ela, é fundamental que pessoas de research tenham sempre em mente que o viés de confirmação pode acontecer, o que vai nos fazer captar apenas o que nos convém.
Muitas vezes, ouvir o que gostaríamos, ou seja, uma percepção que está de acordo com nossas crenças, vai trazer a satisfação pessoal. Em alguns casos, a informação de destaque é uma percepção que a pessoa de pesquisa já tinha. No entanto, esse alinhamento de ideias não pode ignorar todo o resto que foi dito, mesmo que essas outras informações não sejam tão bem avaliadas assim pela pessoa de UX Research.
Diante do viés de confirmação, Denise Rocha deixa uma dica: exerça a autocrítica para analisar se você não está simplesmente querendo validar crenças que já tem!
"Uma dica [para evitar o viés de confirmação] é se perguntar se você não está querendo trazer alguma confirmação para aquela sua ideia 'genial'."
O viés da expectativa é um dos que mais estão ligados ao nosso subconsciente e, por isso, é um dos mais difíceis de serem detectados. Neste caso, não se trata de querer reforçar algo que já se acredita para validar pontos de vista. Neste caso, a tendência natural é aprovar algo com o qual estamos alinhados, mas de maneira praticamente não proposital.
Toda pessoa de UX research tem suas próprias convicções e hipóteses em relação a qualquer coisa que esteja sendo analisada dentro de um produto. Isso pode gerar o risco de foco excessivo em percepções e respostas que vão estar alinhadas com essas visões. Ou seja, havia uma expectativa de encontrar essas informações e, quando elas chegam às pessoas de pesquisa, somente esses pontos levarão destaque.
Segundo Denise, o grande problema é o que se pode fazer com essas informações quando ocorre o viés de expectativa. Ela propõe a reflexão por meio de um exemplo muito real: uma pessoa de pesquisa entrevista algum usuário, colhe as informações e, logo depois dessa entrevista, entra em uma reunião com o time de produto. Nesses casos, quando há o viés, a tendência é repassar apenas as percepções que reforçam essa expectativa existente.
Ou seja, mesmo que um grande volume de informação tenha sido oferecido pela pessoa entrevistada, somente o que interessa à pessoa de research será repassado ao time.
A dica de Denise Rocha para evitar o viés de expectativa é analisar com calma, atenção e cuidado tudo que foi coletado. Isso vai evitar o enviesamento da mensuração das respostas captadas na pesquisa.
"Faça uma reflexão, olhe para aquilo [respostas] com cuidado e olhe para todas as informações que recebeu para evitar fazer uma pescaria, levando só o que vai de encontro com o que você queria ouvir naquele momento."
A desejabilidade social é um viés cognitivo que nos alcança em qualquer momento da vida, uma vez que trata sobre nossa necessidade de aceitação diante de outras pessoas. Isso nos gera insegurança e também nos impede de tomar decisões que realmente desejamos por medo de gerar percepções negativas ou desagradar outras pessoas.
Aqui, precisamos pensar a partir do outro lado do trabalho de UX research, ou seja, a partir da perspectiva da pessoa entrevistada. Em muitas ocasiões, essas figuras simplesmente não conseguem ser transparentes e verdadeiras em suas respostas pelo fato de terem receio de como serão vistas de acordo com o que disserem.
Tudo que o trabalho de UX research precisa é de transparência e verdade. Então, aqui o trabalho consiste em transmitir segurança para pessoas usuárias entrevistadas, reforçando que podem, e precisam, emitir suas percepções com toda sinceridade e sem nenhuma preocupação. Só isso vai garantir a captação de informações realmente relevantes e que podem ser decisivas para UX e produto.
Sobre este viés, Denise reforça que é fundamental ter em vista que isso pode acontecer. É essa consciência que vai permitir criar um roteiro de perguntas que seja conduzido da melhor maneira possível. Assim, há maiores chances de deixar essa pessoa entrevistada o mais à vontade possível, eliminando qualquer risco de enviesamento nas respostas.
"Tenha esse viés em vista para entender como construir o momento [da entrevista] que deixe a pessoa à vontade para dar sua real opinião sem que fique preocupada se o que vai dizer será bem aceito."
A imparcialidade é, acima de tudo, uma necessidade dentro do campo de pesquisas de UX. O grande desafio é saber separar percepções provenientes da experiência de atuação no setor com o que vem de concreto a partir das pessoas usuárias. Um bom cruzamento entre essas duas bases é o segredo para ter informações não enviesadas em UX.
No entanto, o sucesso em UX research passa também por compreender e aceitar que a imparcialidade nunca existirá cem por cento. Afinal, estamos falando de humanos, suas subjetividades e crenças desenvolvidas no dia a dia. Muitas vezes, pessoas de pesquisa acreditam tão fortemente em hipóteses, justamente por conhecer o público e o produto, que acabam enviesando as informações colhidas nas pesquisas.
Não dá, no entanto, para deixar o ego e o excesso de confiança falarem mais alto. Afinal, em UX research, o trabalho é justamente captar a opinião e percepção do público para entender o que essas pessoas precisam e desejam enquanto usuárias. Vale destacar também que uma das premissas das atividades em UX é colocar a empatia em prática. Essa é a única maneira de criar experiências que trazem facilidade, conforto, conveniência e satisfação.
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Por mais experiente que profissionais de UX research sejam, é fundamental trabalhar sempre com a ideia de que os vieses cognitivos existem e podem afetar os resultados a todo momento. Ao fazer isso, todo esse trabalho de coleta de informações e transmissão para o time de UX será mais qualificado, menos enviesado e, como resultado, todos tomarão as melhores e mais acertadas decisões.
Os vieses cognitivos sempre estarão lá, por mais que você pense que está tudo sob controle. Pensar que "matou a charada" mais cedo do que deveria pode causar problemas para um projeto com potencial de sucesso. Portanto, sempre analise de maneira imparcial toda informação proveniente de pesquisas com pessoas usuárias.
Este conteúdo é parte da aula sobre Empatia, do curso UX Design da Tera. Quer entender mais sobre este e outros temas do universo de User Experience? Conheça o curso!